sábado, 8 de novembro de 2008

Uma pequena delícia



O conceituado e internacionalmente famoso arquitecto Ludovico Mies Van der Rohe não teve muita oportunidade de construir na Europa antes da segunda guerra. Isto porque depois de fechada a Bauhaus (pelo regime nazi) foi a vez de ele próprio ter que abandonar o continente e procurar refúgio no país do sonho e da liberdade (1938), para onde tantos outros seus compatriotas emigraram, levando consigo o melhor da Alemanha, tanto nas áreas artísticas como científicas e tecnológicas.

Há, no entanto, algumas excepções. A casa Lemke é uma delas. É um belo edifício. É para mim uma pequena delícia porque contem já claramente os princípios que o arquitecto viria a desenvolver na sua obra, encontrando-se estes, no entanto, ainda numa fase inaugural. Ou, se quisermos, germinal. É de uma simplicidade e de uma clareza impressionantes. Tem praticamente o mínimo para um casal viver: um quarto, uma casa de banho, uma sala, uma cozinha, uma garagem e mais alguns espaços de serviço. Parece-me porém, que a forma como estes espaços se relacionam e articulam está muito bem conseguida. A casa é basicamente um L. Do cruzamento dos dois braços desse L articulam-se todos os espaços. Primeiro o acesso à garagem e a entrada, que por sua vez nos permite escolher entre ir para a sala ou para o hall de acesso ao quarto. Estes dão também acesso a outros espaços. Ou seja, economia de espaço. Muito pouco espaço de circulação. Pode-se aliás dizer que nenhum. Porque tem somente dois halls (o de entrada e o do quarto/pátio) que pela configuração espacial que apresentam e pela função que cumprem na casa, não são propriamente espaços de acesso mas espaços com uma função própria, para além da de circulação. Um, a de recepção à casa, e o outro, de contemplação do pátio. Cumprem o objectivo essencial da arquitectura: dar resposta à função, acrescentando-lhe algo. Todo o restante acesso é feito directamente de uns quartos aos outros: do quarto para a casa de banho, da sala para a despensa, da despensa para a cozinha… As aberturas são já praticamente panos de vidro, ainda que haja ainda algumas janelas.

O sítio é bonito. A casa situa-se no noroeste de Berlim, já bastante fora do centro, em frente a um dos seus muitos lagos (o Obersee). Tem uma bonita paisagem natural e a margem do lago mesmo em frente ao jardim da casa. O L abre-se para o pátio, que por sua vez se abre para o jardim, que por sua vez se abre para o lago. Simples, claro, eficiente. O projecto resolve todos os problemas que levanta. Só me parece mal a escada para a cave, com os típicos degraus triangulares, que são muito pouco confortáveis e ainda por cima feios. No entanto, neste país são muito comuns e largamente utilizados.

A casa foi utilizada para diversos e variados fins depois da guerra. Nos anos 70 foi adquirida pelo estado, mas só em 99 começaram os trabalhos de reabilitação e reconstrução. Neste momento é uma galeria de exposições aberta ao público.


Fotos: http://picasaweb.google.com/Vasco.Cortez/MiesVanDerRoheLemkeHaus#

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